quinta-feira, 29 de abril de 2010

Haja Visto



Se você pretende..."saber quem eu sou..." quer dizer, se você pretende tirar um visto para os EUA, planeje com antecedência. Não faça como eu que deixa tudo para a última hora. E quando falo isso, não estou de brincadeira, é a última hora mesmo. Cheguei no consulado às nove da manhã e a minha entrevista estava marcada para às nove e meia. Dentro do horário, ok. A não ser pelo fato de que seria preciso sair da fila, ir até o Citibank e pagar uma taxa que faltava. Consultei um dos "Posso Ajudar?" que me ajudou e disse que eu poderia sair mas teria que voltar até às dez e meia. Ou teria que reagendar tudo de novo.

Aproveitei para tomar um café no Mega Mate ali perto e dar uma olhada na única barraca de CDs aberta na Pedro Lessa. O banco só abriria daqui a vinte minutos. Nenhuma novidade nos CDs. Só uma edição de "Sabotage" do Sabbath que me deixou bolado. Mas, não era o caso. Não poderia ali me sabotar e perder os primeiros lugares. Larguei o disco e parti para o banco onde uma fila de incautos já se formava.

Levei dois livros para suportar o tempo morto. Um de crônicas do David Sedaris e um do Greil Marcus sobre o Bob Dylan. É uma bobagem, mas só pra constar, isso passou pela minha cabeça, mesmo: Pensei que seria meio "tirar uma ondinha" ler "Like a Rolling Stone - Bob Dylan na Encruzilhada." dentro do Consulado dos EUA, por isso decidi levar também a opção "Sedaris", como sempre uma ótima companhia. Grunfff...onde é que eu tava? Ah, sim...

Cinco minutos para abrir o banco, o segurança pede para que a fila chegue um pouco mais para trás, pois já aconteceu de ladrões renderem funcionários que estavam chegando para trabalhar. "Ele tá insinuando que tem ladrão nessa fila?" Alguém perguntou. "Ele tá aí pra proteger quem? Nós, os funcionários ou o banco?" Não sei, minha senhora, mas dá pra desencostar do meu pescoço?, pensei.

O banco finalmente abre as portas e mesmo em fila, somos obrigados a pegar uma senha. A minha era de número 07. Quando fui atendido, a moça do caixa me informa que o valor a ser pago mudou de 150,00 para 237,40! Putz. Ok, beleza.

Atravesso correndo a Cinelândia e quase esbarro no chopp de alguém (isso lá é hora de alguém beber chopp? Tudo bem, muita gente deve tomar chopp a essa hora, ok. Beleza.) Saquei o restante e volto como um superacelerador de partículas. Eram 10h20. Cheguei no consulado às 10h27. Nova fila. Entrada. Raio X. A funcionária diz que eu devo desligar o celular e que o mesmo ficará com ela. Nova senha. Nova sala. Lotada. Desta vez, meu número era 231. Eles estavam chamando o 157. Mas até que a coisa parecia andar rápido.

Olhei em volta e vi uma mini-lanchonete dentro da sala. Foi nesse momento que entendi a frase de um garoto quando estava do lado de fora. "Tava crente que ia tomar um Seven Up ou uma Coca importada, mas lá dentro só tem joelho e Guaravitão." Tracei uma estratégia rápida se acontecesse alguma coisa que deixasse todos nós presos ali. Tomar uma arma de um dos seguranças e me apossar dos joelhos e dos "Guaravitão".

Depois de algum tempo, pensei em ensaiar algum tipo de protesto. Gritar: "Nicarágua! Capital Manágua!" ou "Revolution, Motherfuckers!" ou ainda "Make my funk a P funk!" ou por outra..."Hey, Ho! Let´s go!" Mas o que vinha mesmo na minha cabeça era subir no balcão e cantar "More than a Feeling" do Boston. Que bosta.

Opa! Meu número! Nova sala. Nova fila. A entrevista foi rápida:
- O senhor já esteve nos eua?
- Já. Em...
- O senhor trabalha com que?
- Sou roteirista de...
- O senhor conhece outros países?
- Conheço a Holan...
- O senhor vai viajar com mais alguém?
- Vou s...ó.
- O visto foi concedido, senhor.

Veio um ímpeto de "Yes" com soquinho no ar...

- Antes de sair, o senhor deve pagar essa taxa de 17,00.

E me contive.

Na fila para pagar a tal da taxa, um homem cutuca o meu ombro:

- Mais uma fila, hein companheiro?

- Oi?

- Você não lembra, mas eu também estava lá no Citibank e também tive que correr atrás de mais dinheiro para completar a taxa. Eu não sabia que tinha aumentado o valor.

- Ah...Mas até que foi tranquilo. Fui até a Senador Dantas.

- Eu fui até a rua México.

- Hmmm...(Foda-se, pensei.) E conseguiu, né?

- Sim.

Depois de um tempo em silêncio, ele continua...

- Mês que vem estou indo viajar pra lá para um encontro de ex-alunos. Me formei por lá.

Comecei a imaginar como seria essa festa e onde seria "Lá". Mas o sujeito foi mais rápido.

- Vai ser um monte de coroa de cabeça branca dançando os sucessos dos anos 70.

- Sério? Ah, então "More than a Feeling" não pode faltar, não é verdade?!

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Stand Up Tragedy

- A Islândia é um país remoto. Definitivamente.

- Um amigo tomou a vacina anti-gripe. E gripou.

- Um quarto do ano já se foi e metade do uísque também.

- O Twitter atingiu a marca de 100 milhões de usuários. Vida que segue.

- Eu leio pensamentos. E de vez em quando eu retuito.

- Vi um camelô vendendo "Avatar" em 4D.

- Que semana...Até o Redentor picharam pra Cristo.

- Achar um político honesto é tão difícil quanto achar um ex-bbb que não goste de publicidade.

- Nos festivais de Forró Universitário um dos ritmos mais executados é o trote.

- Deixa eu ver se entendi quem morreu...Lady Gaga?

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Nossa casa, Nossas Coisas, Nossas Vidas, Nossos Planos

CENA 1
O acesso que já era difícil, tornou-se quase impossível. Agora seria preciso escalar um monte de terra, lama, pedras e ainda enfrentar a chuva, os curiosos e os repórteres.

CORTA PARA

CENA 2
Em um outro ponto da cidade, pai e filho exercitam-se em uma moderna academia de ginástica. Andar lado a lado em uma esteira depois das últimas notícias parecia o único exercício possível e insuspeito.

CORTA

CENA 3
Em algum ponto durante o entardecer ele ficou sabendo da tragédia. O morro onde foi criado desabou com a última tempestade. Correu até lá para saber o que sobrou do pouco que restava. Lembrou do tempo em que ouvia as notícias pelo rádio com o pai. Os dois encurvados sobre a crise mundial do petróleo, a morte de Elvis e o Brasil Tri-Campeão. Coisas que impulsionavam a imaginação de um adolescente que por sorte sobreviveu a infância em uma vizinhança nada pacífica.

CORTA

CENA 4
Depois da sauna e do banho, pai e filho acompanhados dos respectivos seguranças encaminham-se para o estacionamento. A chave do carro está nas mãos do filho que ainda não possui habilitação. "Uma contravenção a mais uma a menos, qual é a diferença?" alguém comentou durante o trajeto. O que preocupava era a notícia de uma emboscada. De que tipo? Tiros, certamente. Logo, pai no carona. Um segurança de cada lado do carro. Chega a informação via celular que um dos depósitos de caça-níquel foi soterrado em mais um deslizamento de terra provocado pela chuva. O pai pensou que o prejuízo seria grande, mas pelo menos foi um desastre natural, uma fatalidade e não uma daquelas situações em que é preciso organizar um acerto com grana, um churrasco e às vezes até uma suruba pra esfriar a cabeça de alguns delegados e juízes.

CENA 5
Repórter local pergunta: "Você perdeu quem?" Ele não responde. Não teve tempo de refletir sobre a natureza das coisas. Embaixo daquele monte de terra, lixo e entulho jazia o passado dele e da cidade dominada por imbecis perversos que nós elegemos, pensou rápido.

CORTA

CENA 6
O filho gira a chave e o carro explode.

CORTA

CENA 7
Repórter local pergunta: "Você perdeu quem?" "Não é fácil aceitar uma coisa dessa, perdi o meu amor." respondeu sem olhar para as câmeras.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Para Ler Em Voz Alta - I

tudo já foi feito
tudo já foi dito
e sentir é infinito
fico besta

*

CHUVA NO RIO
incapaz
cidade

*

- vi um diário boiando na rua alagada
- agora todo dia é isso, nêgo

*

MUTRETA
soltar o verso
dançar o verbo
cantar a letra

*

De
Lírios
Perfumados

*

O QUE VEJO AGORA
livros pilhas de
sofá
computador tela de
papéis caneta telefone
revistas cinzeiro óculos
caderno em branco
TV desligada
janela
temporal

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Tempestade Brainstorm

Tempestade Brainstorm...Tempestade Brainstorm... Tempestade Brainstorm...o ar úmido de Copacabana anuncia...Tempestade Brainstorm...

- Mais um texto pra entrega...mais um livro pra ler...mais um almoço pra tirar do forno...

- Sem idéias, mas também sem grande dificuldades...escrever sobre (?)...

- Pode escolher : Superaceleramento de partículas; Superlotação das metrópoles; Superexposição na mídia; Superaquecimento da Terra
Superabundância de supereventos...Pfff...Tá tudo aí...e você? cadê? cadê você, meu chapa? Não adianta mais ficar com essa cara de menino-do-Colégio-Militar-atento-a-tudo...Tá aonde?

- Papéis contas cartas bilhetes fotos coisas projeto compromisso...

- Sei.

- Vamos tramar contra tudo e contra todos / Vamos transar essas transas todas / Vamos queimar todo esse barato pra ver que barato que dá

- Poema novo?

- O mundo anda mal mas não precisamos abandonar a poesia, não acha?

- Acho. Que tal...fumar um cigarrim?

- Olhei praquela página em branco aberta no computador e gelei...parecia uma piscina que iria mergulhar...meu corpo cansado...já se foi o tempo de escrever um texto em quarenta minutos...hoje a dormência atrás do pescoço e as terminações nervosas...braços e pernas como rios e seus afluentes desaguando na cama...as pálpebras tremendo de cansaço...até que uma palavra...um início de texto vem...Tempestade Brainstorm...

- Sei não.

- Queria mais calma...menos peso em cada palavra...menos o fluxo constante da televisão...menos a obrigação diária de um pensamento estupendo... mais perguntas... menos respostas...

- O que é que você sente quando lê o que sente?

- Sinto que estou em casa...nas palavras...dos outros...

Tempestade Brainstorm...Tempestade Brainstorm...o ar úmido de Copacabana anuncia...Tempestade Brainstorm...